BRASÍLIA – A atriz Regina Duarte foi convidada para assumir a secretaria de Cultura do governo federal após a demissão de Roberto Alvim, demitido nesta sexta-feira depois de divulgar vídeo com discurso com referências nazistas. Em entrevista à Rádio Jovem Pan, a atriz disse estar avaliando ainda se aceita. Segundo apurou o Estado, a ideia do governo é levar um nome de peso, reconhecido no meio cultural, para assumir o posto.
“Estou com este convite, me assusta muito”, afirmou Regina em entrevista à Jovem Pan. “Não é a primeira vez que sou convidada para esse cargo, me assusta muito, porque tem um ministério complicado aí (risos)…”
Regina Duarte já havia sido convidada para integrar o governo no início do ano passado, mas recusou. A atriz é uma das mais famosas apoiadoras do presidente Jair Bolsonaro e já elogiou a política do governo no setor. “Eu não estou preparada, não me sinto preparada para isso, acho que a gestão pública é uma coisa muito complicada e uma pasta como a da cultura muito mais”, disse a atriz à rádio. Segundo ela, a resposta deve ser dada até segunda-feira.
A aproximação de Duarte com Bolsonaro começou ainda na campanha eleitoral de 2018. Na ocasião, a atriz visitou o então candidato em sua casa, no Rio de Janeiro, e imagens do encontro foram divulgadas nas redes sociais.
Quando Bolsonaro foi eleito, o ministro da Cidadania, Osmar Terra, foi até São Paulo se encontrar com ela para discutir políticas do governo para a área da cultura. A atriz, segundo apurou o Estado, foi uma das defensoras de Alvim na época em que ele assumiu uma diretoria da Fundação Nacional das Artes (Funarte), cargo que ocupou antes de ser alçado a secretário.
Em novembro, no entanto, quando Alvim assumiu a Secretaria de Cultura, ela criticou a nomeação de Alvim. Nas redes sociais ela elogiou a decisão de Bolsonaro em mudar a pasta de ministério (da Cidadania para o Turismo), mas também disse não ‘aprovar’ totalmente a escolha do ex-diretor da Funarte para o cargo.
“Não posso dizer que aprovo esta nomeação. Quem me conhece sabe que se eu pudesse opinar, teria sugerido outro perfil de pessoa para ocupar cargo de tal responsabilidade. Alguém com mais experiência em gestão pública e mais “agregadora” da classe artística”, escreveu na época.
Não é a primeira vez que a atriz se envolve na política. Em 2002, Regina Duarte foi destaque da campanha “Eu tenho medo”, contra a candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva. No vídeo da propaganda eleitoral do então adversário de Lula, o tucano José Serra (PSDB), a atriz declarou que tinha “medo” de Lula e que estava preocupada com um possível retrocesso na área econômica com a vitória do PT.
Há mais de 50 anos na televisão brasileira, Regina Duarte contou em entrevista ao programa Conversa com Bial, da TV Globo, em maio do ano passado, que após declarar apoio a Bolsonaro passou a ser chamada de “fascista”. “Em 2002, fui chamada de terrorista e hoje sou chamada de fascista, olha que intolerância?”, desabafou na ocasião.
A atriz afirmou que sente uma certa censura por parte de pessoas que são oposição. “E eu achando que vivia em uma democracia, onde eu tenho o direito de pensar de acordo com o que eu quero. Eu respeito todo mundo que pensa diferente de mim. Não saio xingando as pessoas por aí”, disse à época.
Na mesma entrevista, a atriz afirmou que estava escrevendo uma biografia, relembrou trabalhos históricos na TV, como a série Malu Mulher, e a participação em novelas, sempre no papel de Helena.
Sobre o protagonismo de Regina Duarte interpretando Malu, uma personagem essencialmente feminista e contra os ditos valores morais da época, a atriz revelou: “Eu nunca me declarei feminista, mesmo fazendo a Malu (a série Malu Mulher). Eu não acho que as coisas são por aí. Acredito que há caminhos intermediários. Eu fui e continuo conservadora. Eu só tenho medo de ficar velhinha e dizer: ‘Ah, esse mundo está perdido!’. Que horror!”, concluiu.
Outros nomes são cotados: André Sturm e Josias Teófilo
Além da atriz, outros dois nomes foram citados nos bastidores por integrantes do governo como possíveis substitutos de Alvim na Secretaria de Cultura. São eles André Sturm, atual secretário de Audiovisual do governo federal, e Josias Teófilo, diretor de O Jardim das Aflições, que retrata as ideias do escritor Olavo de Carvalho, guru do bolsonarismo.
O Estado apurou que Sturm está em São Paulo e não procurado. Antes de entrar no governo federal, em dezembro, ele havia sido secretário de Cultura do governo de João Doria (PSDB) na cidade de São Paulo.
O próprio Alvim convidou Sturm ao governo de Jair Bolsonaro durante um almoço na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). Ele foi anunciado à época como nome de “conciliação” em meio a atritos do então chefe da Cultura com o setor.
Já Teófilo é lembrado no governo por ter sido cotado à secretário do Audiovisual do governo no passado. Ele defendeu nesta sexta-feira, 17, nas redes sociais, a saída de Alvim do cargo e disse que rompeu com o então secretário quando Katiane Gouvêa foi nomeada ao governo. “Ele a demitiu e me ligou pedindo desculpa e pedindo indicação para a Secretaria do Audiovisual. Me neguei a indicar um nome porque sabia da gravidade da situação”, disse Teófilo.
Pessoas da área de cultura do governo afirmam estar assistindo ao “bombardeio” causado pelo discurso de Alvim. Eles afirmam estar à espera de uma definição sobre para onde caminhará a pasta. A dúvida é se Bolsonaro dobrará a aposta em nome conservador, discípulo de Olavo de Carvalho, ou se apostará em alguém mais “técnico”, e que não seja uma usina de polêmicas.
Existe ainda indefinição sobre o futuro da equipe trazida por Alvim para a Cultura. Entre eles, Sérgio Camargo, que disse existir um “racismo nutella” no Brasil e teve nomeação à Fundação Palmares suspensa pela Justiça.
A saída de Alvim deixa pontas soltas na Cultura. No fim do mês, o Conselho Superior de Cinema se reuniria para direcionar incentivos ao setor. A situação agora é de “insegurança”.
Há ainda indefinições sobre o Prêmio Nacional das Artes, anunciado com o discurso que causou a queda de Alvim, que distribuiria cerca de R$ 20 milhões. Além disso, apesar do comando da Cultura ter sido levado ao Ministério do Turismo, ainda falta um decreto para levar cargos comissionados à pasta de Marcelo Álvaro Antônio.
FONTE: O TEMPO