ESCRITOR ANTONIO NOBERTO.

MARANHÃO – Para entendermos melhor o mundo que nos espera após um semestre de pandemia e parte dele em quarentena, além dos lockdowns da vida, será preciso vasculhar um pouco dos porões da história em busca dos melhores remédios para uma sociedade empobrecida material e psicologicamente e com direitos restringidos. E inevitavelmente a sociedade sairá da pandemia debilitada, mais pobre e com muitos traumas. Por outro lado, considerando que toda tragédia traz consigo oportunidades e um recomeço, é preciso mais do que nunca ter fé para acreditar no “pote de ouro no pé do arco-íris” e enxergar os nichos de oportunidades que se nos apresentam.

Aqueles que se prepararem com a confiança, estratégias, e um espírito forte e desbravador colherão os frutos oferecidos pela reconstrução e pelo recomeço de um novo mundo. E este deverá ser o perfil das empresas e dos profissionais que obterão sucesso em todo o mundo. Foi o cultivo destes e de outros valores que fez do Maranhão uma estado forte e pujante a partir de meados do século XVIII. Foi um espírito desbravador e empreendedor que fez de São Luís a “Quarta cidade brasileira”, uma princesa em meio a plebe das cidades nortistas. Tudo isto nos faz crer que temos muito a aprender com aqueles que nos legaram exemplos de como vencer as dificuldades e as depressões do espírito e da economia.
O historiador e palestrante Leandro Karnal disse em entrevista, que toda guerra, revolução ou pandemia abrevia processos já existentes, a exemplo da aceleração do uso de tecnologias, o trabalho home office, as reuniões por vídeo conferência e a realização de lives. E outra tendência para o mundo pós-pandêmico é aprender a viver melhor com menos recursos, simplificar e ressignificar a vida e quase tudo em volta. E neste processo de ressignificação, o estado do Maranhão poderá sair na frente se trabalhar a contento e as suas vocações e potencialidades, especialmente no turismo.
Foi exatamente o que fez a Espanha no início da década de 90, quando investiu forte no setor de turismo e em dez anos conseguiu quadruplicar seu PIB no
segmento, que saltou de quatro por cento para dezesseis. O investimento no turismo foi tal monta que o país ibérico subiu posições e passou a figurar entre as sete maiores economias do mundo, graças as estratégias aplicadas no setor.
A Espanha nos ensina que precisamos voltar os olhos para o turismo, enxergar nossas potencialidades e oportunidades. No Maranhão, a estratégia em um primeiro momento é investir no turismo natural em paralelo com o histórico-cultural. Investir no natural é a estratégia em curto e médio prazos, vez que a pandemia está voltando as pessoas para a natureza, para as atividades físicas, e também porque a retomada das viagens privilegiará roteiros de curta distância e, portanto, dentro do próprio país.
E o estado sendo rico em belezas naturais, coloca-se em situação privilegiada. No plano do histórico-cultural, ele deve ser preparado como nunca para ser o nosso carro chefe, vez que o engenho humano, presentes nestes atrativos, voltarão a ser mais valorizados a médio e longo prazos. E para isto será preciso abrir os olhos dos maranhenses para o real valor da nossa história, quando São Luís comandou as ações nesta parte do Brasil, tanto durante a França Equinocial, quanto no século do XIX, período em que éramos a “quanta cidade brasileira”, nas palavras dos viajantes Spix e Martius, que aqui chegaram no início dos anos mil e oitocentos. Precisamos ressignificar e valorizar o legado dos nossos antepassados, combatendo aqueles que sem a correta visão holística se deixam usar pela política pérfida que busca desvalorizar o grande legado que nos foi dado por aqueles que nos antecederam.
E falando em legado e antepassados, eles tem a receita para o crescimento e desenvolvimento do estado nos dias atuais. Só precisamos fazer um exercício de humildade para entender que eles possuíam a devoção ao trabalho e a virtude do conhecimento, qualidades que se traduziram em produção e riqueza material. Eles venceram os obstáculos da época e se tornaram grandes empreendedores, grandes ruralistas e industriais. Tudo começou com o espírito elevado de Sebastião José de Carvalho e Melo (1699 – 1782), o Conde de Oeiras, mais conhecido como o Marquês de Pombal, Primeiro ministro do rei Dom José I, que reinou de 1750 a 1777.
Foi ele quem lançou as bases para o crescimento de Portugal e de suas colônias. O espírito judaico-empreendedor de Pombal foi a senha para o nosso crescimento, que teve início com uma petição de 1752 da Câmara Municipal de São Luís solicitando ao governador Mendonça Furtado a criação de uma sociedade autorizada a explorar o comércio. Daí surgiu a Companhia Geral de Comércio do Grão-Pará e Maranhão, instalada no Centro de São Luís a partir de 1755. Foi o divisor de águas para o estado, que nunca mais foi o mesmo. As casas de palha ou de taipa foram, gradualmente, substituídas para grandes casarões coloniais. Uma lei aprovada pela assembléia provincial autorizou que os filhos dos maranhenses fossem estudar na Europa, fazendo assim o casamento entre conhecimento e empreendedorismo.
Desta união resultou o progresso, com o comércio pujante e intenso e, ao mesmo tempo, uma província que sabia transpor questões menores e galgar espaço internacional. No século XIX, além de uma forte presença lusa, que negociava o grosso do comércio regional, São Luís mantinha com seus gostos e gastos uma colônia de comércio de artigos de luxo, ligada à França, e uma colônia inglesa, que vendia o conforto, através das máquinas. Deste período glorioso restou o maior acervo colonial português da América, o título de Atenas brasileira e o legado do empreendedorismo daqueles que não aceitaram as cortinas de fumaça que os interesses localizados tentavam impor.
Esse deve ser o espírito que precisamos absorver para fazer do Maranhão novamente um lugar de liderança, onde maranhenses, brasileiros e estrangeiros fizeram da sua capital La petite vile aux palais de porcelaine (a cidadezinha dos palácios de porcelana).
Neste período de depressão econômica que nos acomete, é importante lançarmos mão dos ensinamentos e do espírito das outras gerações, especialmente aquelas que fizeram do Maranhão um lugar vicejoso, onde o Brasil e o mundo para cá afluíam em busca de oportunidades, qualidade de vida e de dias melhores.
*Turismólogo, guia de turismo, pesquisador e escritor. Membro da Academia Ludovicense de Letras (ALL); sócio efetivo do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão (IHGM); membro da Luminescence Academie Française (Vale do Loite/França); membro da Academia Vargem-grandense de Letras e Artes (AVLA) e curador da exposição França Equinocial, em cartaz no Centro Histórico de São Luís.
Antonio Noberto