RIO DE JANEIRO – O cantor e compositor João Gilberto, considerado o pai da bossa nova, morreu hoje, aos 88 anos, no Rio de Janeiro. A informação foi confirmada por familiares do músico, como o filho Marcelo Gilberto e a neta Sofia, em mensagens publicadas nas redes sociais. A causa da morte ainda não foi divulgada, mas sabe-se que ele enfrentava problemas de saúde há alguns anos. Baiano de Juazeiro, João Gilberto lançou discos clássicos como Chega de Saudade (1958), O Amor, o Sorriso e a Flor (1962) e Getz/Gilberto (1964), que revolucionaram a maneira de tocar violão e influenciaram gerações de artistas.
“Meu pai morreu. Sua luta foi nobre, ele tentou manter a dignidade à luz da perda de sua soberania”, escreveu Marcelo Gilberto, em inglês, em seu perfil no Facebook.
“Tristeza, tristeza, profunda tristeza. Tudo que ele queria era estar aqui conosco e brincando com sua netinha, nos pedia isso todos os dias, uma coisa muito simples, momentos felizes que foram negados a ele”, escreveu Adriana, mulher de Marcelo. “Meu vovô foi o vovô mais amoroso e carinhoso que eu podia ter tido. Pedia pra eu ir pra lá todos os dias e quando estava tarde da noite e já estava na hora de eu ir embora, depois de eu já ter passado o dia todo com ele, falava: ‘Mas já vai? Dorme aqui!’”, escreveu a neta Sofia na página do Facebook mantida pela mãe.
Conhecido pelo temperamento difícil, João Gilberto estava há décadas recluso, não dava entrevistas e não recebia ninguém em casa, a não ser familiares. O cantor e compositor completou 88 anos no último dia 9 de junho. Uma das “organizadoras” da festança foi Sofia, que preparou brigadeiros para o avô. Além de Marcelo Gilberto, ele deixa as filhas Bebel e Luisa.
Interdição judicial
Desde o ano passado, ele estava sob interdição parcial, ou seja, não podia viver a plenitude de seus atos e direitos. A filha Bebel movia desde 2017 um processo de interdição do pai, motivada pela idade avançada e pela precária situação financeira em que ele vivia –ele chegou a ser despejado do apartamento onde morava no Leblon, zona sul do Rio de Janeiro, por dever anos de aluguel. Em abril de 2018, de acordo com uma reportagem de O Estado de S. Paulo, a Justiça autorizou o arrombamento do apartamento, acatando requerimento de Bebel para verificar o estado de saúde do músico e para que ele pudesse ser citado formalmente no processo de interdição. A ação tinha o objetivo de afastar Cláudia Faissol, ex-companheira do músico, do controle da vida de João. O caso corre em segredo de justiça na 5ª Vara de Órfãos e Sucessões do Rio.
Trajetória
João Gilberto de Prado Pereira de Oliveira nasceu em Juazeiro, no sertão baiano, em 1931. Com 18 anos mudou-se para Salvador, onde se tornou crooner da Rádio Sociedade da Bahia. Em 1950 foi para o Rio de Janeiro e fez parte de alguns conjuntos musicais, mas foi expulso por indisciplina. Em 1958, fez participação como violonista no disco de Elizete Cardoso, com canções de Tom Jobim e Vinícius de Morais. Em março de 1959, lançou Chega de Saudade, considerado por muitos o marco inicial da bossa nova. No disco, João abriu um novo caminho para um novo estilo de tocar violão, com uma batida e uma harmonia diferentes e o canto doce que influenciou, como disse Tom Jobim, “toda uma geração de arranjadores, guitarristas, músicos e cantores”.
Dois anos depois, lançou “O Amor, o Sorriso e a Flor”, da faixa “Samba de Uma Nota Só”. Em 1962, dividiu o palco com Vinícius de Morais, Tom Jobim e o grupo vocal Os Cariocas. Apresentou-se no Festival de Bossa Nova, no Carnegie Hall de Nova York, onde fixou residência e lançou vários discos de sucesso, como a parceria com Stan Getz, Getz/Gilberto, de Garota de Ipanema, pelo qual recebeu um Grammy de melhor álbum em 1965.
Apresentou-se em festivais e grandes casas de espetáculo, da Europa ao Japão, e fez parcerias ao redor do mundo. Em 1980, voltou a residir no Rio de Janeiro. Os últimos discos de João Gilberto foram João, Voz e Violão (2000), que recebeu o Grammy na categoria best world music album, e o João Gilberto in Tokyo (2004).
Depois de longo período fora dos palcos, em 2008 apresentou-se no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, celebrando 50 anos da bossa nova. João foi casado com as cantoras Astrud Gilberto e Miúcha –irmã de Chico Buarque, que morreu em dezembro do ano passado, aos 81 anos– e com Cláudia Faissol, sua empresária.
(FONTE: UOL)