BRASÍLIA – O coronel Nivaldo César Restivo da Polícia Militar de São Paulo, que fora indicado para a Secretaria Nacional de Políticas Penais do Ministério da Justiça e Segurança Pública na última quarta-feira (21), desistiu nesta sexta-feira (23) de assumir o cargo.
Esta é a segunda baixa de indicados à pasta na mesma semana.
Sua saída ocorre após desgaste com a equipe com gabinete de transição. O oficial teve participação indireta na ação policial do massacre do Carandiru, em 1992, que resultou na morte de 111 presos. À época, era tenente no Batalhão de Choque e responsável pelo suprimento do material logístico da tropa em ação.
Em nota divulgada à imprensa, o coronel da PM paulista falou da impossibilidade de conciliar a dedicação exclusiva ao cargo com ” o acompanhamento de questões familiares de natureza pessoal”. Mas agradeceu o convite ao futuro ministro Flávio Dino (PSB-MA).
Integrantes da área de segurança pública avaliam que o indulto concedido nesta sexta (23) por Jair Bolsonaro (PL) a policiais que estavam no massacre do Carandiru aumentou a pressão pela saída do coronel.
Assim que foi anunciada, a nomeação de Restivo incomodou especialistas da área da segurança pública e integrantes da transição.
Como mostrou a Folha, a socióloga Camila Nunes Dias, estudiosa do sistema prisional e do crime organizado, que foi relatora do grupo de trabalho da área de justiça e segurança da transição do governo, foi a primeira a se manifestar.
“Esse anúncio me deixou estarrecida, porque vai completamente contra tudo o que foi indicado no relatório. Sem nada contra a pessoa do coronel, mas contra a concepção de um sistema prisional militarizado”, afirmou à Folha.
“Eu creio que o coordenador do GT [grupo de trabalho], o [futuro] ministro Flávio Dino nem sequer leu o relatório. Eu fico estarrecida, porque tudo o que foi proposto no relatório não tem coerência com essa nomeação. É de um atual secretário que mais encarcera e não é exemplo para os demais.”
Camila chegou a enviar ao grupo de WhatsApp que reúne participantes do GT uma mensagem com reclamações sobre as escolhas de Dino.
“Prezados, acabo de ouvir estupefata o anúncio do novo Depen. Como relatora do tema, tendo trabalhado arduamente nesta transição de forma voluntária e há 20 anos conhecedora do sistema prisional paulista, não posso me furtar a isso. Isso indica que o relatório que entregue para o tema foi ignorado e, especialmente, as centenas de pessoas ouvidas ali. Como relatora, fico constrangida, decepcionada e envergonhada.”
“Essa indicação me traz a sensação de que a transição foi um grande circo”, diz Camila na mensagem.
Já na quinta (22), como mostrou a coluna Mônica Bergamo, integrantes do grupo de trabalho dirigiram ao futuro ministro da Justiça, Flávio Dino, uma carta em que manifestam “constrangimento, decepção e vergonha” com a indicação de Restivo para a secretaria.
A saída do coronel é a segunda baixa na equipe anunciada por Dino na mesma semana. O futuro ministro da Justiça decidiu cancelar, na quarta (21), a indicação do policial rodoviário Edmar Camata para o comando da PRF (Polícia Rodoviária Federal).
Como mostrou a coluna Mônica Bergamo, o servidor foi no passado um entusiasta da Lava Jato e da atuação de Sergio Moro, hoje senador eleito pela União Brasil-PR. Camata também usou as redes sociais para manifestar, na época, apoio à prisão do petista, ocorrida em 2018.
Dino divulgou a anulação a jornalistas na quarta (21), 24 horas após ter anunciado a escolha, na terça (20).
“Tivemos uma polêmica nas últimas horas e o meu entendimento e da nossa equipe é que seria mais adequado proceder a essa substituição”, disse.
Segundo o futuro ministro, a decisão foi baseada em uma avaliação “puramente política”. “Preciso de uma equipe que, além de unida, tenha todas as condições de levar o seu trabalho adiante. Qualquer que seja o dirigente que esteja cercado de polêmicas, é muito difícil que em uma área sensível, o dirigente consiga se dedicar com a largueza e a profundidade necessária, esta foi a razão da substituição.”
(Folha de São Paulo)